- Por Hamza Andreas Tzortzis
Descrição: A existência de Deus não requer evidência. Parte 2 discute respostas a mais duas objeções.
Objeção #2: A crença em uma terra plana não foi uma crença evidentemente verdadeira?
Outra objeção é a crença de que a terra era plana. Isso foi uma verdade auto evidente, uma crença básica. A medida que a ciência progrediu, constatamos que não era o caso. Agora sabemos que a terra é redonda. Não quero entrar em uma grande discussão filosófica sobre crenças básicas ou verdades auto evidentes e se podem ser mudadas por evidência científica futura, mas o que direi é que esse problema não é aplicável à existência de Deus. Deus, por definição, é um ser não-observado e fora de Seu universo. Por exemplo, se eu fizer uma cadeira, obviamente continuo distinto e dissociado da cadeira. Estou fora da cadeira. Da mesma forma, o criador é distinto e externo ao universo.[1] Portanto, o criador não pode ser observado. Não podemos observar o que está fora de nosso universo. Assim, a partir dessa perspectiva, a objeção não se aplica: só é aplicável a coisas que podem ser observadas.
A ciência é baseada na teoria do conhecimento chamada empirismo. O empirismo deriva da ideia de que só se pode ter conhecimento de algo a partir de experiência baseada em observação direta ou indireta.[2] Uma rejeição empírica de Deus é impossível, já que requer evidência a partir de observação para formar conclusões. Negar algo que não pode ser observado usando a teoria de conhecimento que só se pode formar conclusões baseadas em observações é absurdo. O mundo científico não pode negar a existência de Deus porque a ciência só consegue lidar com coisas que podem ser observadas. É por isso que o filósofo de ciência Elliot Sober em seu ensaio sobre empirismo afirma que a ciência está limitada a questões cuja observação ela pode explicar.
“A qualquer momento os cientistas estão limitados pelas observações que têm a mão… a limitação de que a ciência é forçada a restringir sua atenção a problemas solucionados por observações.”[3]
Deus não é observado. Como se pode usar o mundo observado para negar o que não pode ser observado? É impossível. É por isso que a ciência não pode nunca rejeitar a existência de Deus diretamente. Só pode fazer uma das duas coisas:
1.Ficar em silêncio sobre o assunto
2.Sugerir alguma evidência que possa ser usada para inferir Sua existência
Uma resposta comum a essa resposta inclui “se não pode ser observado, não se pode acreditar”. Essa é uma afirmação mal colocada, porque observações não abrangem todos os fenômenos. Existem muitas coisas nas quais acreditamos e que não podemos observar. O filósofo John Cottingham expõe esse problema em seu livro Racionalismo:
“Mas e sobre “toda a água a uma certa pressão atmosférica ferve em 100 graus Celsius”? Uma vez que essa afirmação tem a forma de uma generalização universal irrestrita, o que se segue é que nenhum número finito de observações pode estabelecer sua verdade de maneira conclusiva. Um problema adicional e talvez até mais preocupante é que quando alcançamos os níveis mais elevados da ciência… tendemos a encontrar estruturas e entidades que não são observáveis em qualquer sentido direto. Átomos, moléculas, elétrons, fótons e similares são construções teóricas altamente complexas… aqui parecemos estar muito distantes do mundo de “observação empírica” direta…”[4]
Objeção #3: A crença em Deus não é universal
Uma objeção chave final é que uma vez que verdades auto evidentes devem ser universais, a existência de milhões de ateus em todo o mundo sugere que a existência de Deus não é auto evidente. Existem duas razões para essa objeção ser falsa:
1. Verdades auto evidentes não têm que ser universais:Verdades auto evidentes, crenças básicas ou axiomas podem ser individualizados e não têm que ter um apelo universal. Tome como exemplo a sua mãe. Você tem uma crença básica de que a senhora que chama de mãe é aquela que deu à luz a você. Você não tem que ter um kit de teste de DNA doméstico e aceita o fato de que ela é sua mãe porque para você essa é uma verdade auto evidente. Entretanto, para outra pessoa a senhora que você chama de mãe pode ser sua tia, madrasta ou mãe adotiva. Crenças básicas e verdades auto evidentes não têm que ser universais. Podem ser individualizadas.
2. A crença em Deus é universal: Apesar do número de ateus no mundo, a crença em Deus é universal. Uma crença universal não significa que todas as pessoas do planeta devem acreditar nela. Um consenso intercultural é evidência suficiente para substanciar a reivindicação de que a existência de Deus é uma afirmação universal. Evidentemente existem mais teístas que ateus no mundo, e esse sempre foi o caso desde o começo da história registrada.
Para os ateus e céticos desafiarem de maneira efetiva essas teses, terão que explicar que Deus não é uma verdade auto evidente. Terão que explicar que Deus não é uma crença fundamental, está vinculada culturalmente e só é adquirida via transferência de informação.
NOTAS DE RODAPÉ:
[1]“Para Ibn Taymiyya o termo “criado” implica algo distinto e dissociado de Deus…” (Perpetual Creativity in the Perfection of God: Ibn Taymiyya’s Hadith Commentary on God’s Creation of this World. Jon Hoover. Journal of Islamic Studies 15:3 (2004) pp. 296.)
[2]Elliot Sober “Empiricism” in The Routledge Companion to Philosophy of Science. Editado por Stathis Psillos e Martin Curd. 2010, p. 129.
[3]Ibid, pp. 137-138.
[4]John Cottingham. Rationalism. Paladin. 1984, pp. 109 -110.